domingo, 21 de maio de 2017

ENCICLOPÉDIA ALEGRE DE BRUXAS - Letras T e U


TESOURAS. Uma tesoura aberta sobre uma travesseira livra do poder maléfico das bruxas a todo aquele que, durante o sono, aí repousar a cabeça. Igualmente deve servir uma tesoura (aberta, naturalmente) para evitar que as bruxas ouçam quem fale mal delas. Torna-se evidente que, no pressuposto de Trump, se existir um aparelho micro-ondas por perto, elas ouvem mesmo.
TRAJE. Uma mulher com bata branca será médica ou enfermeira; um homem fardado com um cassetete, papel de multas na mão e um radiotransmissor-receptor será polícia; um fulano com farda verde e com as iniciais CM, será identificado como prestador de serviços menores numa câmara municipal (sim, porque o presidente ou os vereadores jamais usariam uma coisa daquelas); um outro com o cabelo desalinhado, de fraque e luva branca, passará por regente da orquestra, mesmo que perceba tanto de uma pauta musical como eu; alguém de gravata e com sintomas de sonolência, decerto o percebemos como membro do Parlamento. Ora, uma bruxa não possui fardamento, vestes talares ou outro traje característico especial que faça com que se distinga do comum dos mortais. Quando se transformam em patas de cor preta, ratazanas e porcas negras como o azeviche, não são vistas por qualquer um e, se as descobrem, nem sequer imaginam a metamorfose que vai por ali. Apenas a vassoura, os cintos de grandes fivelas e aquele emblemático chapéu cónico que faz lembrar os limitadores de obras na auto-estrada – e que o estilismo de Jean Barthet não desdenharia – as podem denunciar, não estivessem elas, hoje em dia, arredadas desse ultrapassado folclore.
Quem acusar um vizinho ou vizinha de bruxaria, não tendo formas de o identificar, podendo essa pessoa ser aquilo que acusa, é como ouvir dizer a um jacaré que o hipopótamo tem uma boca enorme.
De tudo isto se imagina como é difícil a identificação das bruxas e bruxos, nem mesmo se as virmos, de ouvido atento, à audição da “Sinfonia Fantástica” de Berlioz.
URINA. Atenção a este sinal: quando o lume da lareira começa a dar estalidos, é sinal que as bruxas estão a urinar nele. Se não é bastante para esfriar a fogueira, também não deverá ser confundido com outra prática mais escatológica, que vulgarmente se intitula “chuva dourada”.
Há quem diga que elas celebram os sucessos com o mesmo chinfrim do clube de futebol que arrebanha o tetra. Com o diabo como treinador em slips, executam passes taurinos e, entre elas e ele, exercitam os principais tipos de pegas: de caras, de cernelha, de costas, a de gaiola, o cite do forcado e a pega com o forcado da cara sentado numa cadeira. O diabo, por ter cornos, faz de touro.
UVAS. Esta até o mais empedernido descrente sabe e pratica. Comer doze passas, cada uma com seu desejo, na altura em que soam as badaladas da meia-noite da passagem do ano, é comum e prática generalizada. É uma por cada badalada e não convém atrasar-se nem muito menos engasgar-se. Para o caso de se atrapalharem nos pedidos, usem uma cábula, pois não está proibido este auxílio da memória. Aconselho que reservem uma das passas para que um primeiro-ministro detestado, e a sua comandita, não regressem ao leme do País, porque para pior, já se aguenta assim.
Não convém é sonhar com uvas brancas na noite da passagem de ano ou nas noites seguintes, porque é sinal de lágrimas; no entanto, sendo uvas pretas é sinal de carta, que muito bem pode ser o pagamento de uma multa de trânsito (o mais vulgar e, ultimamente, o mais frequente) ou a liquidação, a pagar, do IRS.

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