sábado, 17 de setembro de 2016

A MENINA E O LULU


Ainda do 3º volume da minha obra  "Contos de Amor e Drama" sai agora este que tem por título "A MENINA E O LULU. Possui um final inesperado, o qual não estará aqui disponível porque só revelo a primeira página. Que querem? É a vida!...


Como quem encontra o que quer, encontra tudo, a senhora foi logo direta ao assunto:
— O senhor é uma espécie de detetive que descobre pessoas desaparecidas?
— Procuro pessoas desaparecidas, sim. Descobri-las, por vezes, é um pouco mais difícil — respondi numa humildade pouco consentânea com os magros proventos da arte. — Além disso, tenho de contar com a concorrência dos parceiros televisivos Ponto de Encontro, Os Mais Procurados e Casos de Polícia.
— Ora, apenas me interessa que o senhor se encarregue do meu caso. Mais nada.
— E quem desapareceu à senhora? O marido, um filho, o velho pai alquebrado e senil?
— O meu cãozinho. O meu lulu Bolinhas, uma das criaturas mais adoráveis que conheci ao cimo da Terra.
Depois de me desassombrar, especulei sobre o desaparecido: uma bola branca, lavadinha e a cheirar a baunilha, tosquiada e com aqueles horrorosos berloques, tipo cordeiro-perneta, que abandonam os detritos malcheirosos pelas calçadas da cidade.
— Vai ver que o bicho entra pela porta quando menos esperar.
— O meu adorável bichano foi raptado!
Pior ainda. Quem se dava ao trabalho de raptar uma "coisa" daquelas? Eu, por exemplo, não o queria nem dado, pois mal tinha para a bucha, quanto mais para veterinários, salões de beleza género boutique du chien, perfumes e refeições que deviam custar o dobro das que eu pagava no restaurante da esquina.
— Dois energúmenos — continuou ela — que vinham numa mota, lançaram-se sobre o pobre bichano quando eu ia a sair do carro com ele ao colo. Ainda mandei o meu motorista em sua perseguição, mas o senhor sabe como são estes bandidos das motas.
Retirou da carteira uma foto do "botão de rosa" e passou-ma para as mãos, antes mesmo de eu recusar a entrada naquela missão canina. Não me enganei na aparência que teci mentalmente do canídeo. Decididamente não queria encontrar o mimalho! Ia dizer-lhe isso, ao mesmo tempo que lhe devolvia a foto, quando ela lançou para os meus tímpanos duas razões de peso que me levaram a reconsiderar: a primeira consistiu no valor astronómico da recompensa, que eu nunca me atrevi a debitar na procura de gente humana; a segunda foi o esclarecimento sobre a falta que o bicho fazia à menina, filha da senhora. Aceitei o encargo.
Depois de me inteirar de alguns pormenores relacionados com o lugar onde e o quando do rapto inopinado, acelerei o que pude para entregar o lulu vivo nas mãos das donas e receber o "taco", que me dava para gastar à grande. Nova luz surgiu no caso, quando a senhora me telefonou, dizendo-me que os raptores prometiam entregar a criatura, mediante uma quantia de monta.
Não me perguntem como, mas após umas visitas a essas lojas de animais, pareceu-me reunir alguns elementos que me conduziam aos mafiosos raptores de lulus de companhia. A cor da mota, a zona onde foi cometido o dislate e tudo o resto estavam a encaixar na pista que eu propunha aquecer. Tinha quase desvendado o imbróglio quanto ao paradeiro do bicho, logo havia de me aparecer aquela miúda, daquelas que nos conseguem fazer pensar em nada, a não ser nelas. Eu não sou muito desse género, mas acontece.
— Sei que não quer ser incomodado, mas não o farei perder tempo. Quanto quer o senhor para deixar de procurar o Bolinhas?
Fiquei parado a olhar para ela. Ofereciam-me dinheiro para encontrar o cão, logo depois uma outra proposta para deixar de o fazer. Fiquei intrigado.
— Está a referir-se a um lulu raptado por dois jagunços?
— Exato. O cão pertence-me.
— O mesmo afirmou outra senhora, de mais idade, em relação ao que julgo ser o mesmo animal.
— Essa senhora é minha mãe — afirmou, peremtória.
— Nesse caso, o cão também é da sua irmãzinha mais nova...
— O cão é só meu! Não tenho irmãzinha mais nova. 

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