segunda-feira, 14 de março de 2011

O MILAGRE DA MULTIPLICAÇÃO (LENDA)


Professou no Convento das freiras de Santa Clara, em Trancoso, a veneranda Madre Francisca da Conceição, natural de Freches, a quem são atribuídos muitos milagres por sua intercessão. Sobre a vida e milagres desta freira, falecida em 14 de Maio de 1711, o Padre Simão Cardoso Pacheco, da paróquia de São Pedro de Trancoso, escreveu uma interessante obra, levada á estampa no ano de 1738
Sobre as obras e milagres de Madre Francisca fez-se, ao tempo e após a sua morte, uma prova testemunhal, com vista à sua canonização, o que não veio a acontecer.
De entre esses milagres, remete-se a este trabalho aquele que, entre outros, diz respeito à vida do próprio convento, conforme com a fama de milagreira de Madre Francisca e do seu Menino. Foi o caso acontecido com a Madre Soror Isabel de S.João, celeireira do convento, que se viu, certo dia, sem pão na tulha para abastecer a comunidade. Varreu todo o grão que pôde na tulha mas, para desespero seu, faltava-lhe o equivalente a duas fanegas para a satisfação de uma semana.
A desconsolada Soror Isabel correu à cela de Francisca e expôs a esta, com a atrapalhação própria dos ansiosos, a falta do grão necessário ao fabrico do pão, que saía dos fornos com o peso de vinte e cinco arráteis cada um.
— Não há-de ser difícil arranjar essas duas fanegas que lhe faltam, Madre Soror Isabel de S.João— terá sossegado Madre Francisca.— Mande varrer novamente a tulha, porque muitas vezes fica entre as aberturas da madeira algum pão. Tudo junto, poderá remediar a falta.
Outra qualquer pessoa, que não conhecesse Madre Francisca, poderia julgar que aquele conselho não passava de zombaria. Tal não sucedeu com Madre Isabel de S.João que, logo,logo, correu até à tulha, cheia de fé, na companhia de uma das serventes. Trataram de varrer e sacudir quanto pão puderam descobrir nas fendas da tulha, nas frinchas do soalho de madeira e nos cantos. Porém medido, não chegava a uma fanega.
— Fiz o que aconselhaste, Madre Francisca — voltou ela, desesperada e com menos fé— mas apenas conseguimos menos de metade do que é necessário. Fazei com que o vosso Menino me acuda nesta necessidade.
— Vá, filha, aonde esse apareceu, poderá haver mais algum grão. Tenham paciência e varram bem a tulha outra vez, que Deus está por nós e não nos faltará.
Voltou a Madre celeireira à tulha, desta vez com fé redobrada. Ela bem sabia, e a servente tinha sido concorde, que a fanega anterior surgira por um milagre e que na tulha, varrida e bem varrida, não tinha ficado um único grão para amostra.
Mal entraram na tulha, a servente deixou escapar uma exclamação:
— Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo! Nesta tulha não deixamos qualquer grão esquecido e agora vejo pão que nós não tínhamos deixado!
Sem grande dificuldade na busca dos grãos, var-reram mais uma vez a tulha. E, depois de medido, verificaram que ainda lá havia cinco alqueires, o bastante para suprir e sobrar a ração semanal.
A madre Isabel e a servente, com os olhos rasos de lágrimas, não se contiveram que não ajoelhassem no meio da tulha. Alma grande e admirável era a de Madre Francisca da Conceição para merecer a bênção do Senhor e a excelsitude da sua magnanimi-dade!

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